Lesões do mal uso da voz. Entre elas a síndrome de Burnout


http://www.ufrrj.br/institutos/it/de/acidentes/voz.htm

INTRODUÇÃO

 Este capítulo é dirigido aos profissionais da voz, entre eles os meus ex-colegas Professores da UFRRJ. É um resumo do trabalho "A Voz do Professor: relações entre trabalho, saúde e qualidade de vida" (de Regina Z.Penteado, Isabel M.Teixeira e Bicudo Pereira - Rev. Bras.de Saúde Ocupacional, 1995/96, vol.25, p.109-129) e também um apanhado de artigos encontrados na Internet.

Além dos Professores, outros profissionais da voz são:
Médicos e Agentes de Saúde, Assistentes Sociais, Extensionistas, Pastores (da alma), Cantores, Atores, Políticos, Leiloeiros, Locutores, Peão ponteiro de "comitiva" e todos aqueles que fazem o uso profissional da voz.

voz.gifA voz é o instrumento de trabalho de aproximadamente 25% da população economicamente ativa, que dela depende todos os dias para alcançar o sucesso em suas ocupações.
Por outro lado, o Brasil é o segundo país do mundo em incidência decâncer da laringe. Esta doença é evitável, pois está associada ao vício de fumar em aproximadamente 95% dos casos. É um câncer de fácil diagnóstico e altamente curável na fase inicial, quando se expressa apenas por uma rouquidão. Mas lembre-se:


ROUQUIDÃO PERSISTENTE É CONSIDERADA UM DOS 7 SINAIS DE ALERTA DE CÂNCER, SEGUNDO A UNIÃO INTERNACIONAL CONTRA O CÂNCER - UICC


 As relações entre trabalho e saúde foram abordadas mais claramente a partir da Encíclica Pacem in Terris, em 1963, pelo Papa João XXIII, que pregava o direito às condições adequadas de trabalho que não fossem lesivas para a saúde.
No Brasil, a 2a. Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador, realizada em Brasília em 1994, ao criar comissões de saúde do trabalhador, determinou que estas deveriam "não só evitar acidentes, mas também garantir a saúde do trabalhador".
O sucesso da 1a. Semana da Voz , realizada no Brasil em 1999, teve repercussão internacional.

A VOZ E A SAÚDE

 A voz é o som básico produzido pela laringe, por meio da vibração das cordas (tecnicamente chamada de pregas) vocais.
A voz expressa as condições individuais (físicas ou emocionais) e, se o indivíduo não estiver em condições saudáveis, a voz deixará transparecer algum problema, ocasionando qualidade vocal disfônica, que pode vir a comprometer a fala e a comunicação.


DOENÇAS PROFISSIONAIS SÃO AS QUE RESULTAM DO EXERCÍCIO DO TRABALHO, INERENTES A DETERMINADAS AÇÕES PROFISSIONAIS.


 Estudo realizado em 1989 por M. Calas mostrou que 96% dos Professores entrevistados sofriam de fadiga vocal, 86% tinham lesões (frequentemente nódulos) e 85% usavam técnica vocal falha.
Dados de 1995 relativos a licenças de saúde para professores, mostram que as doenças do aparelho respiratório se destacam como a maior causa de afastamento: "entre as doenças do aparelho respiratório estão as referentes à laringe e faringe, órgãos estes responsáveis também pela fala, principal instrumento de trabalho do professor".
Thomé de Souza, em 1997, estudando Professores da Secretaria Municipal de Ensino de São Paulo, constatou que a maior parte não sabia avaliar se suas vozes necessitavam de cuidados, embora 75% apresentassem "irritação na garganta", 62% relatassem rouquidão e cansaço ao falar, 47% pigarro e 37% já tivessem "perdido a voz".
sala com muitos alunos

Sala com muitos alunos (como a da foto) exige do professor esforço extra da laringe, podendo causar disfonias.


A VOZ DO PROFESSOR É VULNERÁVEL AO TEMPO E AO USO INADEQUADO, SEM CUIDADOS ESPECIAIS, DEVENDO SER TRATADA COMO VOZ PROFISSIONAL. AS CONDIÇÕES DE SUA ROTINA DE VIDA E TRABALHO, APRESENTAM SITUAÇÕES ESTRESSANTES E FATORES DE RISCO PARA A SUA SAÚDE VOCAL E GERAL.

DISTÚRBIOS VOCAIS E DISFONIAS

 Existem relações entre a saúde vocal, os distúrbios da voz (disfonias) e as condições de trabalho.


UMA DISFONIA REPRESENTA QUALQUER DIFICULDADE NA EMISSÃO VOCAL QUE IMPEÇA A PRODUÇÃO NATURAL DA VOZ.


 Essa dificuldade pode se manifestar por meio de uma série de alterações:
  • esforço à emissão da voz
  • dificuldade em manter a voz
  • cansaço ao falar
  • variações na frequência habitual
  • rouquidão
  • falta de volume e projeção
  • perda da eficiência vocal
  • pouca resistência ao falar
disfonia é, na verdade, apenas um sintoma presente em vários e diferentes distúrbios, ora se manifestando como sintoma secundário, ora como principal.
O indivíduo que padece de um distúrbio vocal sofre limitações de ordens física, emocional e profissional.
A figura abaixo mostra a anatomia da garganta e a localização da laringe.

anatomia da garganta

A SÍNDROME DE BURNOUT

 A ocorrência do estresse ocupacional tem sido observado em todas as partes do mundo, como fator causal de mortalidade, morbidade e ruptura na saúde mental e bem-estar dos trabalhadores.
O impacto dos fatores estressantes sobre profissões que requerem grau elevado de contato com o público, recebe o nome de Síndrome de Burnout. De origem inglesa, este termo significa: queimar, ferir, estar excitado, ansioso.
Trata-se de uma resposta ao estresse emocional crônico, sentimentos relativos ao desempenho da profissão, representado por:
  1. exaustão física e emocional (contrastes entre tensão e tédio)
  2. diminuição da realização pessoal no trabalho (competência, sucesso, esforços falhos, depressão)
  3. despersonalização (distanciamento, separação, coisificação, insensibilidade, cinismo)
  4. envolvimento (pessoas, proximidade, atenção diferenciada)


BURNOUT É A REAÇÃO FINAL DO INDIVÍDUO EM FACE DAS EXPERIÊNCIAS ESTRESSANTES QUE SE ACUMULAM AO LONGO DO TEMPO.


 As situações de estresse contribuem para as condições de mau-uso e abuso da voz, que geram esforços e adaptações do aparelho fonador, deixando o profissional mais propenso ao desenvolvimento de uma disfonia.
As principais causas da Síndrome de Burnout são:
  1. Excesso de trabalho
  2. Sobreesforço (que leva a estados de ansiedade e fadiga)
  3. Desmoralização e perda de ilusão
  4. Perda de vocação, decepção com superiores, etc.

PRINCIPAIS SINTOMAS DA SÍNDROME DE BURNOUT
 a) Psicossomáticos: fadiga crônica, dor de cabeça, distúrbios do sono, úlceras e problemas gástricos, dores musculares, perda de peso;
b)Comportamentais: falta ao trabalho, vícios (fumo, álcool, drogas, café);
c)Emocionais: irritabilidade, falta de concentração, distanciamento afetivo; e
d)Relativos ao trabalho: menor capacidade, ações hostis, conflitos, etc.

TIPOS DE LESÕES

 Os principais tipos de lesões orgânicas resultantes das disfonias funcionais são:nódulos, pólipos e edemas das pregas vocais.Estas 3 alterações da mucosa da prega vocal têm como característica comum, o fato de representarem uma resposta inflamatória da túnica mucosa a agentes agressivos, quer sejam de natureza externa, quer sejam decorrentes do próprio comportamento vocal.

Nódulos

 nódulosOs nódulos resultam de: fatores anatômicos predisponentes (fendas triangulares), personalidade (ansiedade, agressividade, perfeccionismo) e do comportamento vocal inadequado (uso excessivo e abusivo da voz).
O tratamento dos nódulos é fonoterápico. A indicação cirúrgica, todavia, pode ser feita quando os mesmos apresentam característica esbranquiçada, dura e fibrosada, ou ainda quando existe dúvida diagnóstica.

Pólipos

 cistos3.gifOs pólipos são inflamações decorrentes de traumas em camadas mais profundas da lâmina própria da laringe, de aparência vascularizada.
O tratamento é cirúrgicoA voz típica é rouca.
As causas podem ser: abuso da voz ou agentes irritantes, alergias, infecções agudas, etc.

Edemas das pregas (cordas) vocais

 edema.gifOs edemas relacionam-se com o uso da voz. Normalmente são localizados e agudos.
O tratamento é medicamentoso ou através de repouso vocal.Os edemas generalizados e bilaterais representam a laringite crônica, denominada Edema de Reinke. É encontrada em pessoas expostas a fatores irritantes externos, especialmente o tabagismo (fumo) e o elitismo, sendo o mais importante fator associado ao uso excessivo e abusivo da voz.
Quando discretos, os edemas podem ser tratados com medicamentos e fonoterapia, assegurando-se a eliminação de seu fator causal; quando volumosos, necessitam de remoção cirúrgica, seguida de reabilitação fonoaudiológica.

Infecções

 Os fatores infecciosos, incluindo as sinusites, diminuem a ressonância e alteram a função respirstória, produzindo modificações na voz.O efeito primário das infecções das vias aéreas superiores têm efeito direto sobre a faringe e a laringe, podendo provocar irritação e edema das pregas vocais. Estes processos infecciosos podem gerar atividades danosas, como o pigarro e a tosse que, por sua vez, podem causar traumatismos nas pregas vocais.
Há também fatores imunológicos, endócrinos, auditivos e emocionais, que podem causartranstornos na emissão da voz.

LARINGITE CRÔNICA

 O agravamento das irritações crônicas da laringe é denominada laringite crônica.Os sintomas são: rouquidão e tosse, com sensação de corpo estranho na garganta, aumento de secreção, pigarro e, ocasionalmente, dor de garganta.
O tratamento envolve a eliminação dos fatores que provocam a irritação da laringe (exposição a produtos químicos e tóxicos, nível elevado de ruídos, maus hábitos alimentares, refluxo alimentar devido a gorduras, pigarro crônico, etc.), além da promoção de hábitos que melhoram a higiene vocal, evitando os abusos da voz.

O QUE É BOM PARA A SUA SAÚDE VOCAL

  • Beber 7 a 8 copos de água por dia
  • Procurar atendimento especializado se usar a voz na profissão
  • Pastilhas, sprays ou medicamentos, só indicados por Médicos
  • Evitar automedicação e soluções caseiras (gengibre, romã, etc.)
  • Repouso da voz, após cada "apresentação" pública
  • Usar roupas leves e evitar refrigerantes, gorduras e condimentos
  • Realizar exercícios regulares de relaxamento, avaliações auditivas e fonoaudiológicas periódicas
  • Manter a melhor postura da cabeça e do corpo durante a aula, a fala ou o canto.

O QUE É MAU PARA A SUA SAÚDE VOCAL

  • Fumo, álcool, drogas e poluição
  • Tossir, gritar muito ou pigarrear
  • Cantar ou gritar quando gripado
  • Falar em locais barulhentos (Olha o professor aí, gente...)
  • Mudanças bruscas de temperatura
  • Ambientes com muita poeira, mofo, cheiros fortes, especialmente se você for alérgico.

QUEM CUIDA DAS SUAS PREGAS (CORDAS) VOCAIS ?

 Rouquidão provocada por gripe ou resfriado pode ser tratada por um Médico clínico geral ou Pediatra. No entanto, se ela durar mais de 2 semanas ou se não tiver uma causa evidente, deverá ser avaliada por um especialista em voz: o Médico otorrinolaringologista(especialista em nariz, ouvidos e garganta).Problemas com a voz são melhor conduzidos por um grupo de profissionais que inclua o Médico otorrinolaringologista e um fonoaudiólogo.
 Se você quiser saber mais sobre o assunto, consulte o resultado de uma Reunião Técnica realizada recentemente, aqui no Brasil.

http://www.diamundialdavoz.com/site_dmv/dfreq.asp



As doenças mais frequentes
A maioria das alterações da voz são devidas a doenças que devem ser diagnosticadas o mais precocemente possível como por exemplo: laringites, lesões benignas das cordas vocais (nódulos, polipos e quistos), refluxo gastro-esofágico e faringo-laríngeo, utilização incorrecta da voz, paralisia das cordas vocais e cancro da laringe.

Laringite
A laringite aguda é uma inflamação das cordas vocais.
Habitualmente surge durante uma infecção viral do aparelho respiratório que provoca um edema das cordas, comprometendo a sua vibração e traduzindo-se por rouquidão. O melhor tratamento é o repouso vocal e a hidratação.
Como a maior parte destas infecções são devidas a vírus os antibióticos nem sempre são necessários.
Durante uma laringite aguda há que ter o maior cuidado com a utilização da voz, pois aumenta o risco de hemorragias, nódulos, polipos e quistos.



Lesões benignas
O uso incorrecto da voz, o esforço ou o abuso vocal, pode provocar o aparecimento de lesões benignas numa ou nas duas cordas vocais que interferem com a vibração, originando rouquidão, voz áspera e cansaço vocal.
As lesões mais frequentes são os nódulos vocais, também conhecidos por "calos" das cordas vocais. Habitualmente surgem nas duas cordas sensivelmente em frente um do outro.
O seu tratamento exige repouso vocal e reabilitação (terapia da fala), com a qual se procura melhorar a técnica vocal, reduzindo ou anulando o esforço e a tensão do aparelho fonatório.
Os polipos e os quistos são outras lesões frequentes e estão igualmente, relacionadas com esforços e abuso vocal. A cirurgia está indicada, articulada com a terapia da fala.


Refluxo gastro-esofágico e faringo-laríngeo
No refluxo, a acidez do estômago pode subir até à "garganta", provocando, entre outros sintomas, rouquidão crónica ou intermitente, dificuldade na deglutição, sensação de corpo estranho, irritação e dor.
O refluxo faringo-laríngeo pode ser difícil de diagnosticar porque, em cerca de metade dos doentes, não existem queixas gástricas ou esofágicas, nomeadamente ardor retro esternal.
A existência de um refluxo é mais difícil de diagnosticar quando ocorre durante a noite. Nesta situação é frequente os doentes acordarem com uma "irritação na garganta", rouquidão, sensação de desconforto faríngeo, sem conseguirem identificar a causa. A observação pelo Otorrinolaringologista vai esclarecer se estes sintomas são provocados pelo refluxo.


Utilização incorrecta da voz
A rouquidão, assim como as outras alterações, pode ser provocada por uma utilização incorrecta da voz ou, se quisermos, por uma má técnica vocal. É o que sucede quando se fala em tons demasiado agudos ou graves.
Uma técnica vocal incorrecta obriga a um esforço das cordas vocais e dos seus músculos originando a sensação de "fadiga vocal". Os exemplos são vários - intensidade elevada da voz; voz percutida (ritmada); acentuação ou reforço da primeira sílaba de cada palavra entre outros.
A respiração é fundamental para uma voz "saudável". Uma técnica respiratória incorrecta como sucede com a respiração centrada nos ombros ou no pescoço em vez de ser costodiafragmática ou abdominal, vai aumentar a tensão nos músculos do pescoço e da laringe, originando disfonia, associada ou não a outros sintomas (dor e cansaço vocal).
As alterações posturais podem também condicionar alterações vocais. Assim se utilizarmos o telefone apoiado no ombro pode-se provocar a contracção dos músculos do pescoço e da laringe o que vai alterar a qualidade da voz.


Paralisia das cordas vocais
A disfonia assim como outros sintomas, pode estar associada a alterações dos nervos e músculos da laringe sendo a situação mais frequente a paralisia ou a parésia (diminuição da mobilidade) de uma ou das duas cordas vocais. Se as duas cordas vocais tiverem a sua mobilidade comprometida, o que é raro, surge também falta de ar e respiração ruidosa.
A paralisia ou parésia de uma corda vocal pode ser provocada por uma infecção viral como surgir após uma intervenção cirúrgica. Em alguns casos a sua etiologia é desconhecida.
A paralisia de uma das cordas vocais, altera o espaço situado entre elas, provocando uma diminuição da intensidade da voz que se pode tornar fraca e soprosa.
A maior parte das paralisias unilaterais recupera expontaneamente por si só (meses); se a paralisia se tornar permanente, a cirurgia pode ser a solução.
Neste tipo de cirurgia, para a qual existem várias técnicas, vai reposicionar-se a corda vocal paralisada, procurando-se aumentar a sua vibração.
A reeducação vocal (terapia da fala) é efectuada tanto no pré como no pós operatório. Noutros, a terapia da fala é mesmo o único tratamento.
A opção terapêutica está dependente da natureza da paralisia da corda vocal e das alterações da voz.


Cancro da Laringe
O cancro da laringe é uma doença grave que exige um diagnóstico o mais precoce possível.
O tumor da corda vocal provoca alterações na voz tornando-a rouca e áspera. Estes sintomas aparecem logo nos primeiros estádios pelo que se forem valorizados, é possível efectuar o diagnóstico numa fase precoce e obter a cura.
A rouquidão que persista mais do que duas semanas exige a observação por um Otorrinolaringologista, a qual se torna ainda mais urgente num fumador.
O tratamento do cancro da laringe inclui cirurgia, radioterapia e quimioterapia, de uma forma isolada ou em articulação.
Se um tumor da corda vocal for diagnosticado precocemente, é possível obter uma percentagem de cura superior a 90%, quer através da radioterapia quer da cirurgia.
Se notar uma alteração da voz que se torne persistente (ex.: rouquidão ou voz áspera), deve consultar o seu Otorrinolaringologista.


Texto Traduzido e adaptado de:

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